Soluções para o trânsito urbano: o papel do transporte público e sustentabilidade

Investimentos em transporte público, planejamento urbano e práticas sustentáveis são essenciais para enfrentar o caos no trânsito e promover cidades mais saudáveis e eficientes

, em Uberlândia

O trânsito urbano tem sido um dos maiores desafios enfrentados pelas grandes cidades brasileiras nas últimas décadas. Congestionamentos, poluição, perda de tempo e aumento dos custos logísticos afetam não apenas o cotidiano das pessoas, mas também a economia e a saúde pública. Em meio a esse cenário, especialistas apontam que investir em transporte público eficiente e adotar práticas sustentáveis são estratégias fundamentais para reverter esse quadro.

De acordo com a Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), os prejuízos causados pelos congestionamentos nas cidades brasileiras ultrapassam R$ 300 bilhões por ano, considerando impactos diretos e indiretos como perda de produtividade e gastos com saúde devido à poluição do ar.

Soluções para o trânsito urbano: o papel do transporte público e sustentabilidade
Soluções para o trânsito urbano: o papel do transporte público e sustentabilidade – Crédito: Freepik/Canva

Neste artigo, abordamos as principais soluções para o trânsito urbano sob o ponto de vista do transporte público e da sustentabilidade, com base em dados, entrevistas e boas práticas nacionais e internacionais.

Por que o trânsito urbano se tornou insustentável?

A urbanização acelerada, combinada com a priorização histórica do transporte individual, levou ao crescimento exponencial da frota de veículos nas cidades brasileiras. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN), o Brasil possui mais de 115 milhões de veículos registrados, sendo mais de 70 milhões automóveis. Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, isso se traduz em longos congestionamentos diários, com perdas significativas de tempo e qualidade de vida.

Além do tempo perdido, o impacto ambiental é alarmante. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de 7 milhões de pessoas morrem por ano em decorrência da poluição atmosférica, grande parte gerada por veículos movidos a combustíveis fósseis.

Transporte público de qualidade: a espinha dorsal da mobilidade urbana sustentável

A palavra-chave “transporte público sustentável” deve estar no centro do debate sobre mobilidade. De acordo com o urbanista e consultor de mobilidade Paulo Saldiva, “o transporte coletivo bem estruturado é o caminho mais curto e eficaz para melhorar o trânsito nas cidades e reduzir as emissões de gases poluentes”.

Um sistema de transporte público eficiente apresenta diversas vantagens:

  • Redução da frota de carros nas ruas;

  • Menor emissão de CO₂ por passageiro transportado;

  • Custo mais acessível para a população;

  • Integração com diferentes modais (ônibus, metrô, VLT, bicicletas etc.).

Pedestres no transito
Em Londres, a cobrança de pedágio para veículos no centro da cidade reduziu o trânsito em 30% desde sua implementação em 2003 – Crédito: Freepik

Exemplos que inspiram

A cidade de Curitiba (PR) é reconhecida internacionalmente por seu modelo de BRT (Bus Rapid Transit), com corredores exclusivos de ônibus e integração entre linhas. O sistema tem servido de modelo para diversas cidades no mundo, como Bogotá e Cidade do México.

Já São Paulo, com o Bilhete Único e corredores de ônibus, tem buscado melhorar a fluidez e reduzir o tempo de deslocamento. No entanto, desafios como superlotação e falta de manutenção ainda persistem.

Sustentabilidade e mobilidade: um casamento necessário

A mobilidade urbana sustentável envolve mais do que melhorar o transporte coletivo. Ela pressupõe ações integradas que envolvem planejamento urbano, redução de impactos ambientais e incentivo a formas alternativas de deslocamento, como bicicletas, caminhadas e veículos elétricos.

Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o setor de transportes é responsável por cerca de 25% das emissões globais de gases de efeito estufa. Promover soluções de baixo carbono é vital para que as cidades cumpram metas climáticas.

Bicicletas e micromobilidade

Cidades como Fortaleza e Recife têm investido fortemente em ciclovias e programas de compartilhamento de bicicletas. Em Fortaleza, o número de ciclistas aumentou mais de 200% entre 2015 e 2022, segundo a prefeitura local. Isso foi possível com infraestrutura, campanhas educativas e integração com o transporte público.

Além disso, a micromobilidade elétrica, com patinetes e bicicletas elétricas, ganha espaço como solução para os chamados “últimos quilômetros”, complementando os trajetos feitos por ônibus ou metrô.

Planejamento urbano e políticas públicas

Para que o transporte público e a sustentabilidade avancem, é necessário repensar o modelo de planejamento urbano adotado nas cidades brasileiras, que muitas vezes prioriza os automóveis em detrimento de pedestres, ciclistas e usuários do transporte coletivo.

A urbanista Raquel Rolnik, ex-relatora da ONU para o Direito à Moradia, destaca que “cidades mais compactas, com moradia próxima ao trabalho, educação e lazer, reduzem a necessidade de deslocamentos longos e contribuem para a qualidade de vida urbana”.

Políticas como zonas de baixa emissão, pedágios urbanos e subsídios ao transporte coletivo são aplicadas em cidades europeias com sucesso. Em Londres, por exemplo, a cobrança de pedágio para veículos no centro da cidade reduziu o trânsito em 30% desde sua implementação em 2003.

O Sistema Nacional de Trânsito educa, fiscaliza e aplica penalidades
O trânsito urbano tem sido um dos maiores desafios enfrentados pelas grandes cidades brasileiras nas últimas décadas – Crédito: Freepik

Financiamento do transporte público: um entrave a ser vencido

Um dos maiores obstáculos para a melhoria do transporte público no Brasil é o modelo de financiamento. Em geral, ele é sustentado quase exclusivamente pela tarifa paga pelos usuários. Isso cria um ciclo vicioso: tarifas altas afastam usuários, o que reduz a receita do sistema e inviabiliza investimentos.

A proposta de tarifa zero, já adotada em mais de 80 cidades brasileiras, como Maricá (RJ) e Caetés (PE), é um caminho promissor. Em Maricá, a prefeitura subsidia integralmente o transporte, o que aumentou o uso do coletivo e reduziu o número de carros nas ruas.

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Segundo o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), é preciso discutir novas fontes de financiamento, como contribuição das empresas beneficiadas pela mobilidade urbana, fundos públicos e tributação progressiva sobre combustíveis fósseis.

O papel da sociedade na transformação urbana

Não basta apenas esperar por ações do poder público. A transformação da mobilidade urbana requer também consciência coletiva e mudança de hábitos. Incentivar o uso do transporte público, optar pela bicicleta para trajetos curtos, compartilhar caronas e evitar deslocamentos desnecessários são atitudes individuais que, somadas, têm grande impacto.

O arquiteto dinamarquês Jan Gehl, referência mundial em urbanismo humanizado, afirma: “As cidades devem ser feitas para as pessoas, não para os carros”. Sua filosofia tem influenciado projetos em cidades como Nova York, Copenhague e Melbourne.