Um olhar além do diagnóstico: por que o Dia do Orgulho Autista importa para todos
Data é um convite à sociedade para compreender melhor o espectro, combater estigmas e garantir espaço para que autistas sejam protagonistas da própria história
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Uma data para celebrar e também conscientizar: o Dia do Orgulho Autista, em 18 de junho, serve de ponto de partida para falarmos sobre diagnóstico, inclusão e qualidade de vida. Ao longo deste texto, você vai entender por que a data é tão importante, conhecer os principais sinais do espectro, inclusive em adultos, além de descobrir números recentes do Ministério da Saúde, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) sobre a presença do Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Brasil e em Minas Gerais. E, para além dos dados, damos voz a quem vive o autismo em sua realidade cotidiana: o jornalista e editor Paulo Félix compartilha sua vivência no espectro.
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Por que o Dia do Orgulho Autista importa?
A data foi criada em 2002 com o objetivo de promover informação, respeito e visibilidade para pessoas com TEA. O dia é importante para reforçar a mensagem de que o autismo não é uma doença. Apesar de ser uma condição permanente, é um transtorno do neurodesenvolvimento e merece igualdade de respeito e oportunidades.
Para Paulo Félix, de 24 anos, a data é essencial para dar visibilidade real às pessoas autistas. “O Dia do Orgulho Autista é importante para lembrar a sociedade que nós existimos, que estamos aqui e precisamos ser vistos e ouvidos. Não adianta fazer eventos sobre autismo sem a presença de pessoas autistas para discursar. Precisamos ter voz ativa nessas discussões, até porque elas são sobre nós”, destaca.
Números no Brasil
Segundo o Censo 2022 do IBGE, cerca de 2,4 milhões de brasileiros têm diagnóstico de TEA, o que representa aproximadamente 1,2% da população. Os homens são mais diagnosticados (1,5%) em comparação às mulheres (0,9%). Em Minas Gerais, esses dados acompanham a média nacional.
O Ministério da Saúde destaca alguns sinais típicos do TEA:
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Atraso ou ausência de fala;
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Pouco contato visual e pouca reciprocidade social;
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Interesses restritos e comportamentos repetitivos;
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Sensibilidade exagerada a cheiros, sons e texturas.
Esses sinais geralmente aparecem antes dos três anos de idade. A identificação precoce é crucial para que intervenções terapêuticas promovam melhora na comunicação, autonomia e qualidade de vida.

Um olhar para o adulto
Apesar de muitos casos serem identificados na infância, adultos também podem descobrir que estão dentro do espectro. Esse foi o caso de Paulo. “Recebi meu diagnóstico no fim de 2022. Meu psiquiatra sempre suspeitou, mas optava por não emitir o laudo para não me rotular. Depois do laudo, comecei a perceber características sensoriais minhas, como sensibilidade a sons ou seletividade alimentar, que estão ligadas ao espectro. Eu não tinha noção do quanto o autismo estava inerente à minha rotina”, conta.
O diagnóstico em adultos exige avaliação clínica cuidadosa e a escuta de um histórico de vida muitas vezes repleto de incompreensões. “Por receber o diagnóstico já adulto, passei por toda minha vida escolar sem entender bem os motivos dos meus comportamentos vistos como ‘estranhos’ e ‘inadequados’. Hoje passo por algo diferente: ainda tenho resistência a me aceitar plenamente enquanto pessoa com deficiência”.
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Ele também destaca que o autismo não tem um “molde único” e que é necessário que as pessoas entendam que todo autista é diferente. “Não há um perfil único para pessoas no espectro. Cada autista possui singularidades e comportamentos distintos, e sendo assim, merece adaptações distintas”.
Essas singularidades, segundo Félix, se refletem também nas interações cotidianas, que podem variar muito de pessoa para pessoa dentro do espectro. Ele conta que, em seu dia a dia, certas interações sociais ainda podem trazer desafios. “Tem horas que eu não entendo muito bem ironia e figuras de linguagem, levando tudo para o literal. Quando isso acontece, costumo perguntar de novo para a pessoa e geralmente conseguem me esclarecer”, explica ele.
Para lidar com a rotina e organizar suas atividades, ele recorre a métodos práticos: “Eu busco manter uma programação diária estruturada para não me perder nas demandas do dia. Faço isso por meio de aplicativos ou até mesmo com um calendário físico.”
Políticas públicas e tratamento
Há avanços das políticas públicas na evolução do diagnóstico e tratamento do TEA no Brasil. Desde 2012, com a Lei Berenice Piana, pessoas com TEA têm direito a atendimento prioritário em saúde, educação, assistência social e inserção no mercado de trabalho. Pelo Sistema Único de Saúde (SUS), terapias, como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), são oferecidas para promover desenvolvimento e autonomia.
Em Uberlândia, o Centro de Referência a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (CR-TEA), no bairro Pacaembú, é a primeira unidade em Minas Gerais que oferece assistência pelo SUS.
Um convite à empatia
Paulo Félix define ser autista com bastante sensibilidade: “Acho que ser autista é ser plural, em muitos sentidos. Saber enxergar o mundo de uma forma singular, às vezes até dolorosa. Muitos pensam que o autismo se reduz a viver no seu próprio mundo, mas as noções do espectro são bem mais amplas. O autista tenta de muitas formas viver no mundo neurotípico, quando deveria ser incluído nesse mundo”.
Como uma pessoa que vivencia o espectro, ele deixa uma mensagem importante às pessoas com TEA e à sociedade:
“Não desista. Tudo deve parecer nebuloso e estranho agora, mas em algum momento as coisas se esclarecem. Você passou por um turbilhão de sentimentos, e logo, logo você vai se entender melhor”.
“Para os demais, respeitar pessoas autistas e não menosprezar a dor delas é o primeiro passo. Saber ouvir sem julgar, buscar ter empatia também é essencial. Pessoas autistas só querem uma chance, um espaço em um mundo que não foi feito para elas”.