Expansão dos javalis no Triângulo Mineiro intensifica debate sobre manejo da espécie
Audiência pública debateu, nesta quinta-feira (10), impactos da espécie invasora, que causa prejuízos econômicos, ambientais e sanitários na região
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Segundo a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), o javali (Sus scrofa) está entre as cem piores espécies exóticas invasoras do mundo. No Brasil, o animal é classificado como espécie invasora pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Introduzido no país no século XX, o javali se adaptou com facilidade ao ambiente e apresenta alta capacidade reprodutiva, o que dificulta seu controle.

No Triângulo Mineiro, o avanço da espécie em áreas rurais tem causado prejuízos econômicos e gerado preocupações ambientais e sanitárias. Os animais destroem plantações, atacam criações de pequeno porte e competem com a fauna nativa. Também são potenciais transmissores de doenças como peste suína clássica, leptospirose, brucelose, febre maculosa, febre aftosa, entre outras.
Apesar da permissão para o manejo da espécie desde 2013, produtores rurais relatam dificuldades operacionais e burocráticas para obter licenças de abate. O controle é feito por meio do Sistema de Manejo de Fauna (Simaf), plataforma do Ibama que centraliza as autorizações e exige critérios técnicos para garantir a segurança ambiental da atividade. A efetividade do sistema, no entanto, tem sido alvo de críticas do setor agropecuário.
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Relatórios técnicos indicam aumento significativo da presença de javalis nos últimos anos, com registros frequentes de ataques a lavouras de milho, cana-de-açúcar, mandioca e hortaliças. Também há relatos de agressões a animais de pequeno porte e depredação de ninhos de aves como emas, perdizes e codornas.
Audiência pública discute medidas de controle
Diante do agravamento da situação, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) promoveu nesta quinta-feira (10) uma audiência pública para debater alternativas para o controle do javali. O encontro reuniu representantes do setor agropecuário, pesquisadores, órgãos ambientais e autoridades.
Durante a audiência, Osny Zago, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Sacramento e do Núcleo dos Sindicatos do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, apresentou imagens dos prejuízos provocados pelos javalis, incluindo danos em lavouras e áreas de proteção ambiental, como no Parque Nacional da Serra da Canastra. Segundo ele, em Sacramento, os animais chegaram a desviar o curso de um córrego que abastece a cidade, por seu hábito de escavar o solo e formar barreiros.

Zago também destacou que a presença constante dos javalis tem elevado os custos de produção e provocado o abandono da atividade por parte de muitos agricultores. Segundo ele, 40% dos produtores da região mudaram de ramo diante das dificuldades. “O javali aprende o ciclo do agronegócio e migra para onde encontra alimento”, afirmou.
Divergências entre Ibama e caçadores
Na audiência, Júnio Augusto dos Santos Silva, da superintendência do Ibama em Minas Gerais, afirmou que o órgão cumpre diretrizes da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU, que prevê a eliminação de espécies invasoras.
Segundo ele, o controle do javali não deve incentivar a criação de uma cultura de caça por esporte. “Quanto mais se flexibiliza a legislação, mais se transforma o javali em objeto de desejo. O manejo deve seguir boas práticas ambientais e sem crueldade animal”, declarou.
Por outro lado, Rafael Augusto Salerno, representante da Associação Brasileira de Caçadores, defendeu a prática como forma efetiva de controle. Para ele, caçadores e produtores têm sido tratados como criminosos, apesar de atuarem dentro da legalidade. Salerno também afirmou que os custos do controle têm recaído sobre os próprios produtores, estimando que o abate de cada animal pode custar mais de mil reais.
Propostas para política estadual
Rafaela Coqueiro de Sá, do Ministério da Agricultura e Pecuária, defendeu o manejo como parte da estratégia nacional de erradicação de doenças como a febre aftosa. Weber Bernardes de Andrade, representante da Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais (Faemg), avaliou que o projeto de lei em tramitação na ALMG pode ajudar o estado a ter uma política técnica e eficaz de controle do javali.
Walter Freitas de Moraes Júnior, promotor de Meio Ambiente do Ministério Público, ressaltou que o órgão está atento ao problema e que a gravidade da situação exige articulação nacional. “O javali é uma máquina de reprodução e resistência, que exige uma visão diferenciada sobre seus impactos ambientais e econômicos”, afirmou.