Lei contra ideologia de gênero: Prefeitura de Uberlândia terá que pagar indenização de R$100 mil

A decisão que tira efeitos da Lei contra ideologia de gênero se deu a partir de ação movida pelo Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Uberlândia

, em Uberlândia

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A Justiça condenou a Prefeitura de Uberlândia a pagar R$ 100 mil por danos morais coletivos e que se “abstenha de promover a punição, a censura e o controle ideológico com base na Lei Municipal n.º 14.004/2023”. O texto sancionado em julho de 2023 pelo então prefeito Odelmo Leão (PP) foi batizado extraoficialmente da lei contra a “ideologia de gênero” nas escolas.

A decisão é do juiz João Ecyr Mota Ferreira, da 1ª Vara da Fazenda Pública e Autarquias da comarca de Uberlândia. Ele se baseou em ação do Sindicato dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal de Uberlândia (Sintrasp), que questionava a constitucionalidade do texto.

O sindicato argumentou que a lei viola “dispositivos constitucionais que preveem o direito à igualdade, a vedação à censura em atividades culturais, o devido processo legal substantivo, a laicidade do Estado, a competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, o direito de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”.

Diz ainda que o Município tenta sobrepor a Constituição, a qual aponta que “compete privativamente à União legislar sobre diretrizes e bases da educacional”.

Prefeitura
Município informou que vai se pronunciar apenas no processo – Crédito: Prefeitura de Uberlândia

Ao julgar procedentes os pedidos do Sintrasp, o magistrado explica que o ensino deve ter como base a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; respeito à liberdade e apreço à tolerância.

“Já a Lei Municipal n.º 14.004/2023 traz proibições que limitam o exercício da docência pelos professores e do aprendizado por parte dos discentes, impede o debate de ideias e promove a intolerância, na medida em que, conforme assinalado na primeira decisão que proferimos nestes autos, utiliza-se de uma expressão (“ideologia de gênero”) que foi forjada por setores ultraconservadores, que acreditam que professores têm o poder de influenciar na orientação sexual de seus alunos”, diz o João Ecyr da Mota.

Ele segue argumentando que “um determinado setor de nossa sociedade teme, em verdade, é que o professor venha ensinar o menino ou a menina a ter uma orientação sexual diversa da heterossexualidade”.

Em nota, a Prefeitura informou que o “Município irá se pronunciar sobre a lei, que é de autoria do Legislativo, quando iniciar o prazo de recurso após a volta do recesso judicial”.

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A Lei

O projeto de Lei que se tornou a legislação questionada na Justiça foi votado em junho de 2023 e aprovada em Plenário na Câmara Municipal de Uberlândia. Para isso, contudo, foi preciso derrubar um parecer de inconstitucionalidade dado pela Comissão de Legislação, Justiça e Redação.

O texto foi assinado por sete vereadores à época: Zezinho Mendonça, Sérgio do Bom Preço, Sérvio Túlio, Walquir Amaral, Antônio Augusto Queijinho, Anderson Lima, Leandro Neves e Neemias Miquéias.

O texto trazia como justificativa a “finalidade criação de um sistema educativo sócio-pedagógico, dentro do qual possibilite a propagação de conteúdos disciplinares neutros”.

Nessa mesma justificativa há um trecho que informa que o “conceito de ‘ideologia de gêneros’ parte de uma falácia, segundo o qual os defensores da ‘ideologia de gêneros’ sustentariam que a conformação biológica natural seria irrelevante e que as pessoas constituiriam o próprio gênero conforme o ato de vontade”. Não eram citadas fontes para a conceito ou essa argumentação.

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Proibido

A lei, como aprovada, vedava a propagação de conteúdo pedagógico que contenha orientação sexual, ou que cause ambiguidade na interpretação, que possa comprometer, direcionar ou desviar a personalidade natural biológica e a respectiva identidade sexual da criança e do adolescente.

Também não permite veicular qualquer tipo de acesso à conteúdo de gêneros, que possa constranger os alunos, ou faça qualquer menção a atividade que venha intervir na direção sexual da criança e do adolescente.

Isso se aplicaria à exibição de filmes, danças, fotografias e peças teatrais educativas; aulas, palestras, videoconferência, atividades ministradas por conteúdos de internet, até mesmo fora de expediente de aula.

Vetos

O prefeito Odelmo Leão, ao sancionar vetou dois pontos. Um deles eram as punições dadas aos servidores que descumprissem a lei, com suspensões e multas e até perda de cargos. O outro falava sobre a necessidade de informar os alunos sobre “a primazia dos valores familiares nas questões sexuais e ideológicas” no ato da matrícula e de afixar cartazes nas escolas com orientações sobre a lei.