A dança das quadrilhas juninas de Minas Gerais ecoa em Uberlândia

Grupos de Uberlândia se preparam para a temporada das festas junina e mantém tradição da cultura popular

, em Uberlândia

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As sanfonas afinam suas notas, os brincantes — como são conhecidos os integrantes da quadrilha — se organizam para brilhar e os vestidos rodados começam a ganhar vida no tablado. É tempo de quadrilha junina, e em Minas Gerais, essa tradição pulsa forte, embalando corações e memórias com a mesma intensidade de um arrasta-pé bem ritmado.

No epicentro desse movimento cultural, Uberlândia se destaca com os grupos Forrozarte, Estrela Dalva, Balancê e Matutos do Sertão. Mais do que dançar, essas quadrilhas contam histórias, resgatam raízes e celebram o Brasil profundo com emoção e poesia.

As quadrilhas juninas de Minas Gerais têm um brilho próprio. Mais do que coreografias sincronizadas, elas carregam a alma de um povo que se orgulha de suas origens, do sotaque cantado, do cheiro de milho cozido e da fé que atravessa as festas de junho.

Lorraine Andrade  é a fundadora da Forrozarte, do qual tem muito orgulho – Crédito: Ronaldo Filho/Divulgação

Em Uberlândia, o grupo Forrozarte é um dos mais tradicionais e se prepara com intensidade para a temporada. Os ensaios começam meses antes de junho. A cada encontro, os passos são afinados com disciplina, mas também com muito riso e companheirismo.

“A gente não ensina só a dançar. A gente ensina a amar essa cultura”, diz a fundadora e marcadora do grupo, Lorraine Andrade. “O mais importante é ver o brilho no olho do brincante, da pessoa que chega pela primeira vez e se encanta”.

Uma tradição que se reinventa sem perder a essência

Casal de brincantes, como são chamados os dançarinos nas festas juninas – Crédito: Ronaldo Filho/Divulgação

As quadrilhas, como conhecemos hoje, surgiram no Brasil no século 20, inspiradas nos bailes franceses de corte, mas logo ganharam identidade própria nos estados do país. Em Minas Gerais, o jeito simples do interior moldou um estilo particular: mais teatral, mais romântico e sempre cheio de alegria.

“O mineiro tem um jeito muito especial de contar histórias. As quadrilhas daqui são quase peças de teatro dançado. É como se a gente pegasse o palco do mundo e colocasse no terreiro”, afirma o historiador cultural João Lúcio Fonseca, pesquisador da evolução das quadrilhas no Estado.

A cada novo ano, os grupos se reinventam. Em Uberlândia, a Forrozarte apostou em 2025 em um tema que mistura o picadeiro do circo com a tradição das quadrilhas. Com trajes coloridos, cenários lúdicos e uma trilha sonora especial, a quadrilha promete emocionar o público em cada apresentação.

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Ensaios que vão além da dança

Arquidemia é a dama da quadrilha Forrozarte. – Crédito: Ronaldo Filho

Os ensaios da Forrozarte se espalham por três pontos da cidade nos fins de semana, mas à medida que as apresentações se aproximam, o ritmo acelera: a preparação vira diária, de segunda a domingo. Para muitos dos brincantes, a tradição vai além da cultura, é um laço de família, um chamado de alma, um verdadeiro propósito de vida.

“Eu cheguei em 2019 com 13 anos, hoje eu tenho 18. Fui convidada por uma amiga porque ela sabia que eu gostava de dançar. Pelo nome ‘Forrozarte’, imaginei que fosse um grupo de idosos dançando forró”, relembra a jovem Arquidemia Aniceto, dama do grupo. “Já no primeiro ensaio, vi que era algo totalmente diferente, aprendi tudo do zero. Hoje eu vejo o quanto esse movimento é importante e quero que cresça ainda mais”, disse.

Essa paixão também move Laisla Furtado, a “dama da diversidade” da Forrozarte. Coordenadora do grupo e drag queen, ela encontrou na quadrilha uma forma de unir identidade e expressão artística. “Sempre me montei, desde os 18 anos, e já estou com 27. Sempre quis juntar isso com o que amo, dançar quadrilha. E a Forrozarte me abraçou nesse papel. O mais importante é dançar do jeito que você se sente bem e ser aceito. A Forrozarte é minha segunda família.”

Laysla ganhou um concurso e se tornou a dama da diversidade em Uberlândia – Crédito: Ronaldo Filho/Divulgação

E essa entrega não é por acaso. As quadrilhas de Minas competem em festivais regionais, estaduais e até nacionais. Neste ano, a Forrozarte está com uma agenda extensa de apresentações, e cada detalhe conta pontos: figurino, coreografia, sincronia, enredo e, claro, a animação.

O brilho do casal de noivos

quadrilha Forrozarte
Vitória e Mailson são os noivos do grupo Forrozarte – Crédito: Ronaldo Filho/Divulgação

Entre os grandes destaques de qualquer quadrilha, está o casal de noivos, símbolo do romance e da união presentes no enredo das danças. Na Forrozarte, o papel é desempenhado com brilho por Vitória Alves e José Mailson, que estão juntos no segundo ano como casal principal.

“É muita ansiedade. A gente sente um peso grande, porque somos avaliados separados da quadrilha”, explica José Mailson. “Mas quando a gente pisa no tablado, esquece de tudo. É só paixão e entrega”.

Vitória Alves, que também coordena o grupo, conta que sua trajetória na Forrozarte começou em 2018. “Dancei como brincante, parei um tempo, voltei como substituta e, no final de 2023, recebi o convite para ser noiva. É uma responsabilidade imensa, mas também uma honra”.

 

Casal de noivos da Forrozarte
Os noivos são destaque na tradição das quadrilhas em Minas – Crédito: Ronaldo Filho

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O espetáculo vai começar

Com os ensaios a pleno vapor, Uberlândia se prepara para brilhar nas festas juninas deste ano. A Forrozarte fará sua primeira apresentação da temporada em junho, durante os tradicionais arraiais e festivais da região. Mais do que buscar prêmios, o grupo quer emocionar. Quer ver o público bater palmas, sorrir, se lembrar das tradições.

José Elileudo Júnior é coreógrafo da Forrozarte – Crédito: Ronaldo Filho

“Cada passo que a gente ensaia carrega uma história, uma memória. Não dançamos apenas por troféus, dançamos para manter viva a cultura popular”, afirma José Elileudo, coreógrafo e coordenador da Forrozarte.

As quadrilhas juninas de Minas Gerais são assim: um sopro de poesia no meio do concreto. E Uberlândia, com sua paixão pela cultura popular, segue sendo palco dessa dança que nunca sai de moda, nem do coração.