Em Uberlândia, mais de 6 mil imigrantes e refugiados de 123 nacionalidades tentam recomeçar a vida, fugindo da fome, violência e crise em seus países. Desde o início da Operação Acolhida, em 2018, o Brasil já interiorizou mais de 125 mil migrantes e refugiados venezuelanos para 1.026 municípios em todo o país, incluindo diversas cidades de Minas Gerais.
Operação Acolhida interioriza 128 mil venezuelanos, incluindo milhares em Uberlândia – Crédito: Antônio Cruz/Agência Brasil/Divulgação
De acordo com Kelly Pereira, coordenadora da ONG Refugiados UDI, muitas pessoas chegam a Uberlândia fugindo da fome, da violência, da perseguição e das crises econômicas que devastam seus países de origem.
“Oferecemos apoio completo aos imigrantes, incluindo ajuda com documentação, moradia, emprego, roupas, alimentos e aprendizado do português. As aulas de idioma, essenciais para o acesso a serviços, trabalho e estudo, acontecem aos sábados no bairro Tibery, com o apoio da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da UFU.”
A ONG acolhe refugiados e imigrantes de diversas nacionalidades, incluindo Venezuela, Colômbia, Cuba, Afeganistão, Bangladesh, Marrocos, Senegal e Arábia Saudita, entre outros.
“Tivemos até um casal que fugiu do país por não conseguir um marcapasso, mostrando que a migração vai além da questão econômica, sendo também uma luta por sobrevivência”, destaca a coordenadora.
Qual é a diferença de imigrantes e refugiados?
Imigrante: pessoa que deixa seu país por decisão própria, buscando melhores condições de vida, emprego, educação ou oportunidades.
Refugiado: quem é obrigado a fugir de seu país devido a guerras, perseguições, desastres, fome ou ameaças à própria vida.
Refugiados têm proteção legal garantida por tratados internacionais, como a Convenção de Genebra, que assegura direitos como moradia, trabalho e educação no país que oferece refúgio.
Segundo Marrielle Maia, coordenadora da Cátedra Sérgio Vieira de Mello da UFU, é importante entender a diferença entre refugiados e imigrantes com visto de acolhimento humanitário.
Este visto é concedido a pessoas em situação de vulnerabilidade, risco ou emergência humanitária, mas não oferece as mesmas garantias da Lei do Refúgio (Lei nº 9.474/1997), como o princípio de não devolução, que impede que o solicitante seja enviado de volta ao país de origem.
Do câncer à fome: a trajetória de Josué até Uberlândia
O venezuelano Josué Zurita deixou seu país fugindo da crise econômica, mas antes disso, conta que enfrentou um dos piores momentos da sua vida.
“No passado, eu reclamava muito e brigava com Deus pelas dificuldades. Morei com minha família quase oito anos no Peru, onde fui diagnosticado com câncer. Disseram que eu viveria apenas um mês. Meus pais chegaram a procurar uma urna, eu estava praticamente morto.”
Josué Zurita em tratamento contra o câncer no Peru antes de recomeçar a vida em Uberlândia – Crédito: Arquivo Pessoal/Reprodução
Desafiando as previsões médicas, Zurita sobreviveu. Mas ao voltar para a Venezuela, encontrou um país ainda mais devastado.
“O governo controlava tudo e a comida vendida nos bairros vinha estragada, cheia de bichos. Meus filhos ficaram doentes e, ao reclamar, pararam de nos ajudar e marcaram minha casa. Eu ganhava 50 dólares por semana e um frango custava 15. Cheguei a dizer para minha esposa: “Se ficarmos aqui, vamos morrer de fome”
Sem alternativa, decidiu migrar. Chegou ao Brasil com 200 dólares no bolso, passou por Curitiba e depois seguiu para Uberlândia, onde encontrou uma oportunidade de trabalho em sua área, atuando na construção civil com estruturas de isopor.
“A coisa mais difícil desde que cheguei em Uberlândia foi passar dois meses dormindo no chão. Mas desde que comecei a trabalhar com o irmão Mauro, Deus cuidou de todas as minhas necessidades, eles me deram um colchão e estão me ajudando. Agora consigo cuidar da minha família.”
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Cenário migratório
Até meados de 2024, o mundo registrou um recorde de 122,6 milhões de pessoas deslocadas à força, incluindo 43,7 milhões de refugiados.Esse número representa um aumento de 5% em relação ao final de 2023.A maioria dessas pessoas (87%) vive em países de baixa e média renda.
Deportações crescem, imigrantes e refugiados buscam abrigo no Brasil – Crédito: Governo AM/Divulgação
Neste mês um voo com 103 brasileiros deportados dos EUA chegou ao Brasil em meio à crise migratória global, marcada por prisões de estrangeiros em El Salvador. No mesmo mês, Trump proibiu a matrícula de estrangeiros em Harvard.
Ainda em maio, Portugal notificou a saída de 18 mil imigrantes e no início do ano, outro avião da FAB trouxe 88 brasileiros deportados para Minas Gerais.
Até 2024, 6.053 pessoas solicitaram registro migratório em Uberlândia, segundo dados da Polícia Federal.
Esse número não representa exatamente o total de imigrantes que vivem na cidade, já que considera aqueles que formalizaram o pedido de registro no município.
Um dos grupos mais expressivos é o de haitianos, que somam 1.252 registros, muitos deles vindos ao Brasil desde o terremoto que devastou o Haiti em 2010, além de outros que continuam chegando por conta de crises ambientais e políticas.