Existe onça-pintada no Triângulo Mineiro? Especialistas explicam comportamento do animal
Morte de Jorge Avalo, atacado por uma onça-pintada no rio Miranda, no dia 21 de abril, gerou preocupação sobre o aumento dos conflitos entre humanos e animais
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A trágica morte de Jorge Avalo, de 60 anos, atacado por uma onça-pintada às margens do rio Miranda no último dia 21 de abril, chamou a atenção dos internautas e lançou uma preocupação crescente entre ambientalistas e especialistas em fauna silvestre: a intensificação da convivência entre humanos e animais selvagens em áreas de conflito, especialmente no Pantanal e entorno.
O ataque, considerado raro pela Polícia Militar Ambiental (PMA), reaquece o debate sobre os riscos e responsabilidades da ocupação humana em habitats naturais.
André Quagliatto, professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e presidente da ONG PAS DO BRASIL, aponta que o comportamento das onças está sendo alterado pela aproximação do ser humano em seu habitat natural e afirma que na região não há registros de ataques contra humanos.
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Uma mudança de comportamento?
Quagliatto chama a atenção para um fator novo e alarmante: a mudança de comportamento alimentar das onças, provocada diretamente pela ação humana.
“Temos observado pessoas jogando peixes, restos de alimentos ou carcaças de animais nas margens dos rios para atrair as onças e registrá-las em fotos ou vídeos. Esse tipo de atrativo confunde o animal, modifica sua forma natural de caça e cria um comportamento condicionado de buscar alimento fácil onde há presença humana”, alerta o especialista.
Segundo ele, essa prática também aumenta os riscos de ataques. “A onça é um animal extremamente inteligente e dotado de uma memória genética poderosa. Quando ela aprende que em determinado local existe alimento disponível sem esforço, ela volta. E, ao associar aquele espaço à comida, pode acabar vendo um ser humano como competidor, ameaça ou até parte do ambiente alimentar”, explica.
O Pantanal, que vive um crescente aumento do turismo de pesca e de observação da fauna, especialmente no Mato Grosso do Sul, tem se tornado palco frequente dessa aproximação imprudente. Em muitas margens de rios da região, relatos indicam o uso de “cevas” (iscas) para atrair grandes felinos.
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O caso envolvendo Avalo, que trabalhava como caseiro em um pesqueiro, levanta suspeitas de que o local já pudesse ser ponto de alimentação recorrente para o animal.
“Essa memória genética, transmitida de geração para geração, faz com que esses animais memorizem esses locais como áreas de alimentação fácil”, acrescenta Quagliatto. Esse comportamento pode resultar em aproximações mais frequentes das onças a áreas habitadas por seres humanos, o que aumenta o risco de encontros perigosos.
Outro ponto crítico levantado por especialistas é a expansão humana sobre áreas naturais, impulsionada tanto pelo avanço urbano quanto pelo uso agropecuário.
“A onça precisa de grandes áreas para caçar, se reproduzir, se esconder. A cada avanço do ser humano, ela perde território, e isso aumenta a probabilidade de encontros. E, infelizmente, algumas pessoas têm se aventurado demais, ignorando os limites naturais desses animais”, afirma Quagliatto.

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Precauções para convivência segura
Com o aumento da convivência entre humanos e onças, os especialistas reforçam a importância de medidas preventivas para evitar ataques. Quagliatto orienta que, ao se deparar com uma onça, o ser humano deve manter distância, evitar movimentos bruscos e dar espaço para o animal se afastar.
Já o veterinário Márcio Bandarra, do Hospital Veterinário da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), afirma que grande maioria dos ataques ocorre quando o animal é colocado em uma situação sem saída. No entanto, ainda conforme ele, os encontros podem ser esporádicos: “é importante ressaltar que esses ataques são extremamente raros, muito abaixo dos casos de mortes causadas por mosquitos ou animais peçonhentos”.
O especialista explica que, com a diminuição de seus habitats naturais e o aumento da urbanização, as onças acabam se aproximando de áreas habitadas. Por isso, é fundamental a implementação de políticas de conscientização que protejam tanto os animais quanto a população.
“Garantir a preservação ambiental e a biodiversidade é crucial para diminuir a presença de onças nas áreas urbanas. Cada vez mais, é necessário compreender que essas espécies estão em risco e precisam ser preservadas”, completa.
Na prática, algumas medidas podem ajudar a prevenir esses confrontos, principalmente próximo de áreas urbanas. Segundo Bandarra, uma das primeiras ações é reconhecer que a onça está tendo seu espaço reduzido e, portanto, precisa do suporte para viver em seus habitats naturais. Além disso, ele sugere que, ao avistar uma onça perto de uma residência, a recomendação é não tentar espantar o animal, mas manter a distância e as luzes externas acesas e aguardar o felino se deslocar para áreas de mata.