O declínio dos musicais: especialistas mineiros analisam o porquê

Cineastas e músicos mineiros analisam os motivos que afastam o público dos musicais e como a indústria cinematográfica pode reverter essa tendência

, em Uberlândia
24/10/2024 ÀS 11H41
- Atualizado Há 46 minutos atrás

‘Coringa: Delírio a Dois’ prometeu mas decepcionou grande parte do público. Com um orçamento de US$ 200 milhões, o filme arrecadou cerca de US$ 192 milhões nas bilheteiras ao redor do mundo após 22 dias desde sua estreia. O filme, lançado dia 4 de outubro, estará disponível nas plataformas de streaming no dia 29 de outubro, ficando menos de um mês em cartaz.

'Coringa: Delírio a Dois' é estrelado por Lady Gaga e Joaquin Phoenix - Crédito: Divulgação
‘Coringa: Delírio a Dois’ é estrelado por Lady Gaga e Joaquin Phoenix – Crédito: Divulgação

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O que afasta o público dos musicais?

As razões para a baixa adesão a filmes musicais podem estar ligadas a algumas de suas características distintivas. Em uma indústria que frequentemente repete fórmulas e aposta em propriedades intelectuais já conhecidas, o segundo filme do Coringa se distancia do primeiro.

Em vez de um drama psicológico situado em uma Gotham City dos anos 80, o público se depara com um musical, um gênero que não é muito apreciado pela maioria das pessoas. Embora o fato de ser um musical não seja, por si só, o problema, a execução e o equilíbrio entre os gêneros são cruciais para a recepção do público.

Um olhar através do audiovisual

De acordo com a cineasta Nara Sbreebow, os musicais de Hollywood desempenharam um papel importante na introdução do gênero ao público brasileiro. Produções como “A Noviça Rebelde” (The Sound of Music), “Grease” e “Cantando na Chuva” (Singin’ in the Rain) tornaram-se muito conhecidas no Brasil e foram exibidas repetidamente na TV aberta, alcançando grandes audiências.

“Por incrível que pareça, no geral, o público brasileiro aprecia filmes de musicais, especialmente aqueles que contam com elementos de cultura pop ou têm forte apelo emocional.”

Esses filmes, com números musicais vibrantes e narrativas cativantes, conseguiram encantar várias gerações de brasileiros. No entanto, para Nara, a quebra na fluidez da narrativa pode parecer antinatural para algumas pessoas, especialmente para aquelas que não estão acostumadas ao formato.

“Muitos espectadores podem se sentir desconectados quando uma história é interrompida por um número musical.”

A cineasta acrescenta que o público brasileiro possui uma forte conexão com a música, mas essa relação costuma estar mais associada ao consumo de shows, festivais e até novelas, onde a música entra de forma orgânica.

“Nos musicais, a transição da fala para o canto muitas vezes parece artificial e pode não ser algo com o qual o público esteja acostumado, o que gera uma barreira na aceitação do gênero como parte do entretenimento cinematográfico”

Apesar disso, ela vê as ferramentas de streaming como uma oportunidade para a maior aceitação do gênero, pois permitem que os espectadores tenham mais controle sobre o que assistem. Isso pode encorajar aqueles que normalmente evitariam musicais no cinema a experimentá-los em casa, onde podem pausar ou pular trechos.

A maior exposição a diferentes estilos, como no Disney+, que oferece musicais de diferentes épocas e culturas, possibilita um maior contato com esse gênero. Musicais como “Hamilton” ou “Encanto”, que foram sucessos no streaming, mostram que o público pode se envolver quando há facilidade de acesso e inovação.

Esse estilo de gênero demanda uma segmentação do público, com algoritmos de recomendação. As plataformas podem sugerir musicais com base nos gostos individuais, criando uma experiência mais personalizada e aumentando a chance de aceitação dos musicais.

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Musicais estão presentes na sociedade há muitos anos - Crédito: Everett Collection
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Um olhar musical

A musicista e professora de música e Artes, Monalisa Dias Lau, mencionou que a história dos grandes musicais começou com a indústria de Hollywood, que, desde os anos 1920, se dedicava a criar sucessos baseados em temas populares.

Inicialmente, a estratégia era repetir temas que estavam em alta, mas essa repetição acabou sobrecarregando o público, levando ao desgaste e ao cansaço. Monalisa destacou que, na década de 1920, o sucesso dos musicais estava relacionado à forma como a música era apresentada, por meio de uma combinação de gestos, dança e interpretação. Com o tempo, essa saturação resultou em um declínio do interesse, especialmente após sucessos como “O Mágico de Oz” e “Cantando na Chuva”.

A repetição de temas semelhantes levou a uma diminuição do público interessado por musicais, refletindo a dificuldade da indústria em inovar dentro de um formato que, embora popular, se tornou previsível. Monalisa também apontou que as transições entre diálogos e canções em musicais podem parecer forçadas, devido à complexidade de integrar esses elementos.

Ela explicou que, quando um personagem expressa tristeza por meio de uma música, a mudança para outro assunto frequentemente exige uma alteração no tom musical, o que pode dar a impressão de que os diálogos não fluem naturalmente. A estrutura das músicas requer que temas diferentes sejam separados para que a narrativa mantenha seu sentido. Quando um tema musical termina, é necessário introduzir uma nova música para seguir a história.

Isso pode causar a sensação de que a narrativa está sendo fragmentada, enquanto, na verdade, essa abordagem é essencial para preservar a lógica musical. Aqueles que estudam o assunto podem compreender melhor essa dinâmica, enquanto o público em geral pode achar que as mudanças são abruptas ou estranhas.

A música afasta o público?

Apesar do que muitos pensam, a música não distrai o espectador; pelo contrário, enriquece a experiência do musical. Segundo Monalisa, a percepção de que a música pode afastar o público da narrativa é equivocada.

Na verdade, a música possui o poder de expressar emoções de maneira mais intensa e contagiante. Quando um personagem está feliz, sua performance irradia alegria, enquanto momentos de tristeza são igualmente expressivos.

Ela também mencionou que a dificuldade em manter a atenção do público por longos períodos está mais relacionada à velocidade das interações modernas, onde o acesso à informação é instantâneo, especialmente por meio de celulares.

Dessa forma, a música não apenas complementa a narrativa, mas também a torna mais envolvente e prazerosa, ajudando a transmitir sentimentos de maneira eficaz.

“A música, ela ajuda muito mais, porque ela torna mais prazeroso. Ela ajuda a expressar sentimentos, quando está com raiva a pessoa canta com um pouquinho mais de força. Quando ela está mais feliz, ela canta de uma forma que as outras pessoas são contagiadas em volta. Ela expressa todas essas formas de sentimentos através da voz.”, conclui.

 

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Vinícius Ribeiro

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