Para eles, a luta contra o câncer nunca tem fim, faz parte do dia a dia

Conheça a rotina dos profissionais da saúde que lidam diariamente com a dor alheia no Hospital do Câncer em Uberlândia  

24/10/2024 ÀS 07H42
- Atualizado Há 1 hora atrás

Muito provavelmente você já ouviu falar do Novembro Azul. Mais provável ainda que conheça a causa defendida pelo movimento Outubro Rosa. Indiscutivelmente essas são algumas das campanhas de saúde mais conhecidas entre os brasileiros, sendo dedicadas respectivamente à conscientização sobre o câncer de próstata e o câncer de mama.

É muito comum que neste período do ano, muito se fale sobre a dor da perda, os cuidados com a saúde, as histórias de superação, a importância da prevenção e do autocuidado. Mas existe um ponto em comum que conecta todas essas histórias. Geralmente, como dois mais dois são quatro, sempre que houver um paciente acometido pelo câncer, haverá um profissional da saúde aos seus cuidados.

Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos apoia pacientes que estão na luta contra o câncer
Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos apoia pacientes que estão na luta contra o câncer – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

A partir de agora, você vai conhecer alguns personagens que fazem da luta contra o câncer uma luta diária pela vida. Esta matéria é sobre a rotina de quem trabalha diariamente com a dor dos pacientes oncológicos no Hospital do Câncer em Uberlândia.

Dando o melhor de si

Todos os dias, Anaisa Carneiro chega no hospital, conversa com a equipe de enfermagem para se atualizar sobre o plantão e avalia os pacientes, fazendo prescrições de acordo com a necessidade. A médica de 31 anos, é a responsável técnica pelo Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos, e realiza diariamente reuniões de acolhimento com a equipe, os pacientes e seus familiares.

Anaisa é a médica responsável pelo Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos que apoia pacientes que estão na luta contra o câncer
A médica Anaisa é a responsável técnica do Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

Anaisa cuida de pacientes oncológicos com a doença em estágio avançado. Ela conta que um dos maiores desafios envolve lidar com as fragilidades inerentes ao quadro clínico dos pacientes como: dor, enjoos e a falta de ar. Além disso, para ela, as questões que mais pesam são os desafios emocionais dos pacientes, familiares e as vezes, da própria equipe médica que também necessita de cuidados.

Já Leonardo Santos, médico de 35 anos, vive uma rotina essencialmente ambulatorial. Ele atua em consultório, atendendo e programando o tratamento dos pacientes que vivem a luta contra câncer. Segundo ele, o fluxo de atendimento em média acaba sendo entre 5 e 10 pacientes por turno.

Leonardo se preocupa com o bem estar de seus pacientes que estão na luta contra o câncer
Leonardo se preocupa com o bem estar de seus pacientes – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

Ele tem consigo o compromisso de proporcionar o melhor tratamento possível aos pacientes, limitando o tratamento nos casos mais graves. Situações em que as terapias oncológicas deixam de ser efetivas e podem piorar bastante a qualidade de vida do paciente.

Compartilhando a mesma dor

Para Leonado, é impossível não haver uma transferência de sentimentos entre os profissionais da saúde e seus pacientes: “De alguma forma sentimos a dor deles. Acredito que uma forma saudável de limitar isso é buscando válvulas de escape fora da medicina, assim como, conciliar essas estratégias de proteção com uma carga horária menor”.

O médico comenta sobre o paradoxo que vive em ter recebido na faculdade treinamento para salvar vidas, mas ter que aprender a lidar com a dor da perda de maneira natural.

Trabalhando no Hospital do Câncer há cerca de 37 anos, o oncologista Rogério Agenor de Araújo, relata como foi se adaptar emocionalmente para suportar essa dor:

“Quando eu era residente o sofrimento era muito mais intenso. Ou a gente morria um pouquinho com cada paciente que partia, ou a gente sofria intensamente com o sofrimento de cada um. Só que você tem que perceber que se essa intensidade de sofrimento não for melhor absorvida, no final você também adoece. Então, essa questão de perdas ao longo dos anos vai melhorando. O que não pode acontecer é perder a sensibilidade, mas, como se diz: criar uma casquinha no pé para continuar andando e não sentir tanta dor”, compartilhou o Rogério.

No centro da imagem está Rogério e a equipe que luta contra o câncer
No centro da imagem está Rogério e sua equipe no ano de 1990 – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

Impondo limites ao sofrimento

Rogério explica que estabelece limites para saber até onde pode ir com determinado paciente. O oncologista diz que, quando percebe que o prognóstico de um paciente é ruim, que ele não vai ser curado, concentra esforços para entender o que pode ser feito para melhorar a sobrevida dele, para minimizar eventos adversos e não oferecer tratamentos inúteis.

Lara de Andrade Marques, de 33 anos, entende que reforçar para si mesma que fez o que era possível para ajudar um paciente, ajuda a lidar com o sofrimento. A enfermeira responsável pelo Centro de Cuidados Paliativos Oncológicos, diz ainda que os cuidados com a mente também são importantes e, para isso, ela não abre mão da terapia semanal.

A enfermeira Lara ajuda os pacientes a lidarem com a luta contra o câncer
Lara ajuda os pacientes a lidarem com o sofrimento diário – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

Há 4 anos no Hospital do Câncer, Lara vivencia óbitos quase todos os dias. Ela conta que, com o apoio de uma equipe multiprofissional, tenta minimizar a dor e o desconforto que os pacientes e seus familiares apresentam na luta contra o câncer, e que esse processo acaba a ajudando também.

Anaisa reforça esse discurso e diz que é preciso cuidar de si para poder cuidar bem dos outros: “Faço atividade física regularmente, tenho uma alimentação saudável e sono adequado na medida do possível, faço acompanhamento psicológico quinzenal, além do apoio espiritual: eu frequento toda semana um centro espírita para palestras e apoio religioso”.

📲 Siga o canal de notícias do Paranaíba Mais no WhatsApp

Transformando sonhos em realidade

Aqui nossa história ganha um toque de conto de fadas. Isso é o que acontece quando os profissionais que trabalham no Hospital do Câncer de Uberlândia se juntam para realizar desejos. Como é o caso de uma paciente que sonhava em dar uma festa de 15 anos pra filha.

Leonardo relembra de um caso pontual, onde um de seus pacientes optou por suspender o tratamento para passar um tempo com maior qualidade de vida próximo de seus familiares: “Sem náuseas, vômitos e outros efeitos colaterais da quimioterapia. Optou por, mesmo que as custas de uma expectativa de vida menor, passar esse tempo com maior serenidade”.

Anaisa menciona o caso de um outro paciente que deixou boas lembranças: “Tivemos um paciente jovem que tinha o desejo de ser batizado e pela sua fé precisaria ser em águas correntes que vão para o mar. Foi providenciado transporte de ambulância e seu desejo foi realizado uma semana antes da sua despedida, que foi no dia do seu aniversário”.

Esperando por um futuro melhor

Leonardo comenta que, felizmente, os tratamentos oncológicos têm evoluído em um ritmo acelerado e os pacientes têm vivido mais e melhor. Mas pontua que ainda existem questões a melhorar: “São medicamentos de alto custo, então, existe uma dificuldade de acesso. Acredito que uma meta para o futuro deve ser democratizar o acesso a essas terapias”

Já Rogério acredita que a evolução dos últimos anos é “estrondosa”:

“não só das drogas antes do ano 2000, em que se usava mais a bioterapia tradicional, mas novas drogas surgiram no nosso artesanal terapêutico. E a partir dos anos 2000 o foco foi mudado. Começaram as pesquisas na biologia molecular e descobriu que cada tumor tinha um marcador específico. Então começou a se construir drogas alvo contra esse marcador específico, que hoje a gente chama de anticorpos monoplanais ou imunoterápicos. Uma terapia guiada e não a quimioterapia clássica que destrói o tumor, mas destrói muita célula boa também”, disse o oncologista.

A terapia guiada ajuda os pacientes a ter uma melhor qualidade de vida durante a luta contra o câncer
A terapia guiada ajuda os pacientes a ter uma melhor qualidade de vida durante o tratamento – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

“Novas formas de diagnosticar o câncer de mama”, esse é o tema da pesquisa de doutorado da enfermeira Lara. Para ela, a pesquisa em diagnóstico precoce é o melhor caminho para encontrar a cura: “Vejo que a medicina evolui a cada dia, mas que precisamos de políticas públicas para levar os resultados encontrados para população, em especial aos usuários do SUS”.

Dando um show em equipe

Os profissionais ressaltam que a oncologia atual é essencialmente multiprofissional, ou seja, ninguém faz nada sozinho. O paciente que vivencia a luta contra o câncer, é encaminhado ao hospital e recebe acompanhamento com equipes de enfermagem, nutrição, psicologia, fisioterapia, serviço social e outras especialidades conforme a necessidade de cada um.

Da esquerda para a direita: Anaisa, Lara, Leonardo e Rogério. Para eles a luta contra o câncer não tem fim
Da esquerda para a direita: Anaisa, Lara, Leonardo e Rogério – Crédito: Grupo Luta Pela Vida

Juntos, a Anaisa, a Lara, o Leonardo e o Rogério, somados a todos os outros profissionais que cuidam desses pacientes, formam uma corrente de amor e dedicação.

E essas são apenas algumas das histórias que são escritas e encenadas todos os dias pelos artistas que pisam no palco do Hospital do Câncer de Uberlândia. Sim, artistas que, pelo show, merecem ser aplaudidos de pé. Porque não há no mundo obra de arte mais humana, nem ato de amor mais bonito, do que se doar pelo outro.

 

Leia mais:

Veja também

Michele Araújo

1 hora atrás

Acompanhe nossa programação ao vivo!